sábado, 8 de novembro de 2014

Toda a verdade sobre ser Engenheira Informática

O blog Por Falar Noutra Coisa que muito aprecio publicou há dias o texto "Ser Engenheiro Informático tem glamour" que explica, na 1ª pessoa, o que é ser Engenheiro Informático - com tudo o que há de mau e de mau. É raro haver um Engenheiro Informático que abra assim o livro publicamente e que explique o que é esta profissão. Mais raro ainda é alguém explicar o ponto de vista feminino da coisa - não vou falar do que é que as mulheres pensam deles mas sim do que é SER uma Engenheira Informática.


Quando ainda estudava, na mui nobre Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), os alunos dos vários cursos de Engenharia diziam com orgulho que os engenheiros eram oficialmente conhecidos como sendo "feios, porcos e maus". Das engenheiras não havia nenhuma descrição oficial, mas off-the-record, ouvi muita aluna de engenharia ser descrita como "calhau com dois olhos". No entanto não posso deixar de recordar o comentário mais poético proferido por um colega meu, referindo-se a uma rapariga de outro curso de Engenharia que caminhava à nossa frente num corredor, dizendo "Aquela ali só metendo-lhe uma bandeira na cara e dar uma pela pátria". Ser Engenheira Informática é ser vista pelos colegas como alguém com quem se pode ter as mesmas conversas que se teriam com os amigos machos, mesmo eles sabendo que só tenho uma única cabeça que posso utilizar para pensar.

A escassez de mulherio tinha o seu impacto, até nos professores. Lembro-me de um professor, de bases de dados, que utilizava religiosamente, nos seus exemplos, bases de dados sobre cinema onde constavam registos nas tabelas como "Instinto Fatal", "9 Semanas e Meias", "Sharon Stone" e "Kim Basinger". Certo dia, eu e alguns colegas tivemos que ir ao gabinete dele por causa de um trabalho e percebemos de onde vinha esta inspiração: a imagem que servia de Ambiente de Trabalho no computador do professor era uma fotografia da Kim Basinger vestida com uma t-shirt branca molhada e sem soutien. No Instituto Superior Técnico a escassez de mulheres deu origem à existência de prostituição em barda à volta do edíficio, na FEUP ficou-se só pelos Ambientes de Trabalho bem decorados - até nisto tinhamos muito mais classe.

Como Engenheira Informática cedo me habituei a trabalhar em ambientes onde predomina a testosterona. Rapidamente acabei por ser agradecida que assim fosse, principalmente quando no meu primeiro emprego visitei departamentos de outras áreas e aprendi que nos escritórios também existem galinheiros - as salas onde trabalham só gajas e onde só se consegue ter um minuto de silêncio se alguém morrer ou se as colocarmos a todas em frente a um computador a ver fotos da colecção de roupa interior masculina do Cristiano Ronaldo.

Na cabeça da minha mãe, ter uma filha Engenheira Informática é como ter acesso directo ao suporte técnico de "equipamento informático" (notem as aspas) tão complexo como telemóveis e fornos de cozinha. Não me esqueço das últimas férias de Verão, onde perante um forno de cozinha duplo, a minha mãe virou-se para mim e disse "Ó filha, tu que és lá das Informáticas, põe lá isso a trabalhar". Eu respondi com um ar muito sério que já não me lembrava daquilo que tinha aprendido na cadeira de Fornos e Culinária Informática na faculdade mas que o livro de instruções era capaz de ajudar se ela o lesse. Isto tudo para ouvir "mas tu estás mais habituada a ler essas coisas do que eu". Está claro que, para a minha mãe, ser Engenheira Informática é estar apta a ler livros de instruções de tudo aquilo que para ela é Informática, ou seja, tudo o que se liga à electricidade e tem alguma luzinha a piscar.

Ainda não falei das vantagens de ser Engenheira Informática. Em todas as empresas existem pessoas que têm uma relação de ódio com os departamentos de IT. São pessoas que quando têm um problema no carro sabem que a oficina mais próxima é o sítio onde ir para lhes resolverem o problema, mas quando têm um problema no computador têm um ímpeto incontrolável de ir ter com os Engenheiros Informáticos do departamento de IT para os culpar pelo problema. A vantagem de ser Engenheira Informática nestas situações é quando esta malta nos aparece à frente e precisa de 5 minutos para se recompôr do choque de ter que falar com uma mulher. São os 5 minutos que tenho para destruir a auto-estima daquela pessoa quando dou a entender que estou muito mal impressionada com um homem que não se sabe safar de um problema tão básico e que foi causado por ele próprio. Sei que o efeito que lhe causo no meio das pernas é pior do que quando ele vai à praia e entra num mar gelado.

O melhor é quando esse colega tenta recuperar a imagem iniciando uma conversa para demonstrar que está a par das últimas novidades tecnológicas e puxa de tópicos tão complexos como as últimas funcionalidades da app do Facebook para iPhone. Eu vou ouvindo, sorrindo mas sabendo que aquela pessoa vai passar a considerar-me amiga dele e que vai cair na tentação de me telefonar à mínima dificuldade que tenha. Todo o trabalho que aquele colega teve para tentar recuperar a imagem de masculinidade é destruído ao fim de algumas horas quando há uma falha de energia em todo o escritório e ele me telefona a pedir ajuda porque o computador não liga. É a partir daqui que eu prefiro lidar com os problemas "informáticos" da minha mãe porque ao menos ela já percebeu que a electricidade tem alguma coisa a ver com o assunto.

"When you are dead, you do not know you are dead. It's only painful and difficult for others. The same applies when you are stupid." - ser Engenheira Informática é lembrar-me disto todos os dias.


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